domingo, 27 de junho de 2010

O Guia do Mochileiro das Galáxias diz o seguinte a respeito de voar:

Há toda uma arte, ele diz, ou melhor, um jeitinho para voar. O jeitinho consiste em aprender como se jogar no chão e errar. Encontre um belo dia, ele sugere, e experimente. A primeira parte é fácil. Ela requer apenas a habilidade de se jogar para frente, com todo seu peso, e o desprendimento para não se preocupar com o fato de que vai doer. Ou melhor, vai doer se você deixar de errar o chão. Muitas pessoas deixam de errar o chão e, se estiver praticando da forma correta, o mais provável é que vão deixar de errar com muita força.

Claramente é o segundo ponto, que diz respeito a errar, que representa a maior dificuldade. Um dos problemas é que você precisa errar o chão acidentalmente. Não adianta tentar errar o chão de forma deliberada, porque você não irá conseguir.

É preciso que sua atenção seja subitamente desviada por outra coisa quando você está a meio caminho, de forma que você não pense mais a respeito de estar caindo, ou a respeito do chão, ou sobre o quanto isso tudo irá doer se você deixar de errar.

É reconhecidamente difícil remover sua atenção dessas três coisas durante a fração de segundo que você tem à sua disposição. O que explica por que muitas pessoas fracassam, bem como a eventual desilusão com esse esporte divertido e espetacular. Contudo, se você tiver a sorte de ficar completamente distraído no momento crucial por, digamos, lindas pernas (tentáculos, pseudópodos, de acordo com o filo e/ou inclinação pessoal) ou por uma bomba explodindo por perto, ou por notar subitamente uma espécie muito rara de besouro subindo num galho próximo, então, em sua perplexidade, você irá errar o chão completamente e ficará flutuando a poucos centímetros dele, de uma forma que irá parecer ligeiramente tola. Esse é o momento para uma sublime e delicada concentração. Balance e flutue, flutue e balance. Ignore todas as considerações a respeito de seu próprio peso e simplesmente deixe se flutuar mais alto. Não ouça nada que possam dizer nesse momento porque dificilmente seria algo de útil. Provavelmente dirão algo como: "Meu Deus, você não pode estar voando!" É de vital importância que você não acredite nisso: do contrário, subitamente estará certo.

Flutue cada vez mais alto. Tente alguns mergulhos, bem devagar no início, depois se deixe levar para cima das árvores, sempre respirando pausadamente.

NÃO ACENE PARA NINGUÉM.

Quando você já tiver repetido isso algumas vezes, perceberá que o momento da distração logo se torna cada vez mais fácil de atingir. Você pode, então, aprender diversas coisas sobre como controlar seu vôo, sua velocidade, como manobrar, etc. O truque está sempre em não pensar muito a fundo naquilo que você quer fazer. Apenas deixe que aconteça como se fosse algo perfeitamente natural. Você também irá aprender como pousar suavemente, coisa com a qual, com quase toda certeza, você irá se atrapalhar _ e se atrapalhar feio _ em sua primeira tentativa. Há clubes privados de vôo aos quais você pode se juntar e que irão ajudá-lo a atingir esse momento fundamental de distração. Eles contratam pessoas com um físico inacreditável _ ou com opiniões inacreditáveis _, e essas pessoas pulam de trás de arbustos para exibir seus corpos _ ou suas opiniões _ nos momentos cruciais. Poucos mochileiros de verdade terão dinheiro para se juntar a esses clubes, mas é possível conseguir um emprego temporário em um deles.

sábado, 22 de maio de 2010

Planeta de Golgafrincham

O Guia da Galáxia para Caronas diz isso a respeito do planeta de Golgafrincham: é um planeta com uma história antiga e misteriosa. Rico em lendas, vermelho, e às vezes verde, com o sangue daqueles que lutaram em tempos idos para conquistá-lo; terra de paisagens áridas e ressequidas, de ar doce e estonteante com o aroma das fontes perfumadas que brincam entre suas pedras quentes e poeirentas e nutrem os liquens escuros abaixo delas; terra de mentes febris e imaginações intoxicadas, particularmente entre os que experimentam esses liquens; terra também de idéias frescas, à sombra, entre
os que aprenderam a amaldiçoar os liquens e achar uma árvore para sentar embaixo; terra também de sangue, aço e heroísmo; terra do corpo e do espírito. Esta era sua história.
Em toda esta história antiga e misteriosa, as figuras mais misteriosas eram sem dúvida as dos Grandes Poetas do Círculo de Arium. Estes Poetas do Círculo viviam nos caminhos de montanhas remotas, onde ficavam à espera de pequenos grupos de viajantes incautos para fazer um círculo em torno deles e apedrejá-los.
E quando os viajantes gritavam, perguntando por que eles não iam embora escrever poemas em vez de ficar importunando as pessoas com essa estaria de jogar pedras, eles paravam subitamente e entravam com uma das setecentas e noventa e quatro grandes Canções dos Ciclos de Vassilian. Tais canções eram de extraordinária beleza, e de comprimento ainda mais extraordinário, e todas se encaixavam exatamente no mesmo padrão.
A primeira parte de cada canção narrava como havia deixado a Cidade de Vassilian um grupo de cinco príncipes sábios com quatro cavalos. Os príncipes, que são naturalmente bravos, nobres e judiciosos, viajam a terras distantes, combatem ogres gigantes, seguem filosofias exóticas, tomam chá com deuses sobrenaturais e salvam lindos monstros de princesas vorazes antes de anunciarem que atingiram a luz e que suas andanças portanto estão concluídas.
A segunda parte, muito mais comprida, de cada canção falava sobre todas as brigas para quem ia voltar a pé. Tudo isso repousava no passado remoto do planeta. Foi, no entanto, um desses excêntricos poetas quem inventou as estarias espúrias sobre uma catástrofe iminente, que permitiram ao povo de Golgafrincham livrar-se de todo um terço inútil de sua população.
Os outros dois terços permaneceram firmemente em casa e levaram vidas cheias, ricas e felizes até que foram todos subitamente exterminados por uma doença virulenta contraída de um telefone sujo.

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

O Universo — algumas informações para ajudá-lo a viver nele.

1 — Ãrea: Infinita
O Guia da Galáxia para Caronas oferece a seguinte definição para a palavra
"Infinito”.
Infinito: Maior que a maior de todas as coisas e mais um pouco. Muito maior que isso, aliás, fantasticamente imenso, de um tamanho totalmente estonteante, um verdadeiro tamanho tipo "puxa, como é grande!". O infinito é tão grande que em comparação a ele a própria grandeza parece uma titica. Gigantesco multiplicado por colossal multiplicado por exorbitantemente enorme é o tipo de conceito a que estamos tentando chegar.
2 — Importações: Nenhuma.
Ê impossível importar coisas para uma área infinita, pois não há exterior de onde importá-las.
3 — Exportações: Nenhuma.
Vide Importações.
4 — População: Nenhuma.
Sabe-se que há um número infinito de mundos, simplesmente porque há um espaço infinito para que os haja. Todavia, nem todos são habitados. Assim, deve haver um número finito de mundos habitados. Qualquer número finito dividido pelo infinito é tão zero perto de que não faz diferença, de forma que a população de todos os planetas do Universo pode ser considerada igual a zero. Daí segue que a população de todo o Universo também é zero, e que quaisquer pessoas que você possa encontrar de vez em quando são meramente produtos de uma imaginação perturbada.
5 — Unidades Monetárias: Nenhuma.
Na realidade há três moedas livremente correntes na Galáxia, mas nenhuma delas conta. O Dólar Altairiense entrou em colapso recentemente, a Baga Flainiana só é intercambiável por outras Bagas Flainianas, e o Pu Trigânico tem seus próprios problemas muito específicos. Sua taxa de câmbio de oito Ningis por cada Pu é bastante simples, mas como cada Ningi é uma moeda triangular de borracha de seis mil e oitocentos quilômetros de lado, ninguém jamais as juntou em número suficiente para possuir um Pu. Ningis não são moedas negociáveis, porque os Bancos Galácticos recusam-se a lidar com trocados. Partindo-se dessa premissa básica, é muito simples provar que os Bancos Galácticos também são produto de uma imaginação perturbada.
6 — Arte: Nenhuma.A função da arte é portar o espelho da natureza, e simplesmente não existe um espelho que seja grande o bastante — vide ponto um.
7 — Sexo: Nenhum.Bem, para dizer a verdade tem uma porção, amplamente devido à total falta de dinheiro, comércio, bancos, arte ou qualquer outra coisa que pudesse manter ocupadas todas as pessoas não-existentes do Universo. Todavia, não vale apena embarcar numa discussão sobre isso porque seria terrivelmente complicada. Para maiores informações veja os capítulos do Guia de números sete, nove, dez, onze, catorze, dezesseis, dezessete, dezenove, vinte e um e oitenta e quatro inclusive, e a bem da verdade quase todo o resto do Guia.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Disaster Área - a banda mais barulhenta

O Guia da Galáxia para Caronas diz que o Disaster Área, uma banda de rock plutoniano das Zonas Mentais de Gagrakacka, é geralmente tido não apenas como a mais barulhenta banda de rock da Galáxia, mas de fato a coisa mais barulhenta de todas. Os freqüentadores habituais de seus shows julgam que o lugar onde se ouve o som com o melhor equilíbrio é dentro de bunkers de concreto a uns sessenta quilômetros do palco, enquanto os próprios músicos tocam os instrumentos por controle remoto de uma espaçonave altamente isolada que fica em órbita em torno do planeta — ou, mais freqüentemente, em torno de um planeta completamente diferente. Suas músicas são no geral bastante simples e a maioria seguindo o velho tema familiar do rapaz que encontra a moça sob uma lua prateada que então explode por nenhuma razão adequadamente explorada. Muitos mundos já baniram suas apresentações, algumas vezes por razões artísticas, mas mais comumente pelo fato da aparelhagem de som da banda infringir os tratados locais de limitação de armas estratégicas.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Para os descontraídos:

E em muitas das civilizações mais descontraídas da Orla Oriental Exterior da
Galáxia, superou há muito tempo a grandiosa Enciclopédia Galáctica como depositário clássico de todo o conhecimento e sabedoria, pois apesar de apresentar muitas omissões e de conter muita coisa apócrifa, ou pelo menos tremendamente inexata, ele supera a outra obra mais antiga e corriqueira em pelo menos dois aspectos importantes. Em primeiro lugar, é ligeiramente mais barato; em segundo lugar, traz estampada na capa, em letras garrafais e amigáveis, a frase NÃO ENTRE EM PÂNICO. Trata-se, é claro, do indispensável companheiro de todos que desejam conhecer as maravilhas do Universo conhecido por menos de trinta dólares altairianos por dia — O Mochileiro das. O Guia da Galáxia para Caronas é um companheiro indispensável para todos aqueles que estão interessados em dar sentido à vida num Universo infinitamente complexo e confuso, pois apesar de não ter esperanças de ser útil e informativo em todas as questões, ele pelo menos traz a alegação tranqüilizadora de que onde ele está incorreto, está pelo menos definitivamente incorreto. Em casos de maior discrepância, é sempre a realidade que está errada.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

O que o guia traz sobre a terra

Ford, que estava sentado num canto da cabine, cantarolando, olhou para Arthur. A parte da viagem em que a nave só se deslocava no espaço sempre lhe parecera muito chata.
-Que foi? perguntou ele
-Se você está fazendo pesquisa pra esse livro e se você esteve na Terra, então
você deve ter algum material sobre a Terra.
- É, deu pra aumentar um pouco o verbete original, sim.
- Deixe-me ver o que estava nessa edição, tenho que ver.
- Está bem!
Estendeu o livro a Arthur de novo. Arthur segurou o livro, tentando
fazer com que suas mãos parassem de tremer. Apertou o botão da página que o interessava. A tela iluminou-se, piscou e exibiu uma página. Arthur ficou olhando para ela.
- Não tem nadai. exclamou.
Ford olhou por cima do ombro de Arthur.
- Tem sim. Olhe lá embaixo, logo abaixo de T. Eccentrica Gallumbits, a prostituta de três seios de Eroticon 6.
Arthur seguiu com o olhar o dedo de Ford e viu para onde ele apontava. Por um momento, ficou sem entender; de repente, sua mente quase explodiu.
-O quê? Inofensiva? Só diz isso, mais nada? Inofensiva! Uma única palavra!
Ford deu de ombros.
- Bem, tem 100 bilhões de estrelas na Galáxia, e os microprocessadores do livro são limitados. disse ele. -Além disso, ninguém sabia muita coisa a respeito da Terra, é claro.
-Bem, eu espero que você tenha melhorado um pouco essa situação.
-Ah, sim, consegui transmitir um novo verbete pra redação. Tiveram que resumir um pouco, mas de qualquer modo melhorou.
- E o que diz o verbete agora? perguntou Arthur.
-Praticamente inofensiva. disse Ford, com um pigarro, para disfarçar seu constrangimento.
-Praticamente inofensiva! gritou Arthur.

sábado, 7 de novembro de 2009

Ar no vácuo

O Guia do Mochileiro das Galáxias afirma que, com os pulmões cheios de ar, é possível sobreviver no vácuo total por cerca de 30 segundos. Porém afirma também que, sendo o espaço estonteantemente grande do jeito que é, a probabilidade de ser salvo por outra nave durante esse período de 30 segundos é da ordem de uma chance em duas elevado a 276.709.